Corria o ano de 1999 quando por mero acaso decidi concorrer ao IX Concurso Nacional de Jornalismo Juvenil, promovido pela Comissão Nacional dos Descobrimentos Portugueses (extinta por Decreto-Lei em 2002). O tema desse ano era "A chegada dos Portugueses à China e a Fundação de Macau". Ainda hoje não sei como ganhei: acabei de reler o texto e não posso deixar de o sentir como bastante fraquinho. Já para não falar da recorrente anteposição do adjectivo. Mas, vendo bem, para um puto de 14 anitos até nem está nada mal.
Pergunto-me, também, quem raio usa como pseudónimo algo como "Lives"? O regulamento exigia que escrevessemos sob a égide de um pseudónimo e eu escolho um completamente estúpido. Sem comentários.
Bem, o que é facto é que lá fui, durante 9 dias, até Macau, Hong Kong e China. E só para que fiquem ainda mais invejosos, tudo em hotéis e restaurantes de 5 estrelas.
Finalmente, a pedido de algumas almas, aqui fica o dito texto, bem como algumas fotografias.
"- Era uma vez ...
- ... Um jovem aventureiro que, como outros do seu tempo decidira largar a casa paterna e rumar ao Oriente à procura de riquezas, quem sabe, de glórias. Seu nome era João. Era um Luso com ânsia de conquistas. Após venturosa jornada encontrou-se nas terras orientais, encontrou-se num mundo afortunado! Animais de muitas cores e feitios e flores tão variadas que tornavam o ambiente paradisíaco. Tantas belezas embeveceram-no, tantas riquezas seduziram-no!... Com o tempo, tornou-se num afamado mercador. Em troca das bugigangas europeias recebia as maiores riquezas que o mundo alguma vez vira. Eram naus de cravo e canela, ouro e marfim ... Obteve completo controlo da navegação no Incógnito e de alguns pontos estratégicos em terra. Os principais centros de comércio foram conquistados por ele. Tudo lhe corria favoravelmente. Aos poucos os seus sonhos iam-se concretizando.
Só que um dia, enquanto navegava pelo mar de Malaca com um carregamento de boas especiarias, desceu sobre a sua armada súbita procela. A espuma deixou de sorrir, o mar viu-se sem a sua luxúria azul. As naus em vão tentavam lavrar as truculentas águas. Das lúgrubes nuvens choviam relâmpagos encolerizados que rasgavam os celestiais véus. Temerosos trovões ecoavam pelos ares, fazendo-os estremecer. A dama de preto, com sua foice na mão, bem esperou por eles. Esperou, esperou, mas deles nada conseguiu. A vontade de viver era grande! Os nautas debatiam-se corajosamente com as águas furiosas que violentamente os sacudiam. Oraram aos céus, mas nada. Os ventos lutavam impetuosamente, as águas rugiam medonhas. E nisto andaram cinco dias ... depois, veio a bonança. Durante esses dias escuros como breu, uma embarcação perdeu-se, outra ficou com o mastro principal pela metade. Apenas uma nave se mantinha inteiramente viva. Estavam perdidos no grande oceano, como agulha no palheiro. Estavam ao sabor da maré, os errantes peregrinos. Os dias passavam e as esperanças iam fenecendo. Mas, semanas depois, enxergaram, ao longe, a tão desejada terra. Os olhos encheram-se de ledas lágrimas: todos se abraçavam calorosamente. Deus era louvado com harmoniosos cânticos. Como a penumbra já começara a baixar decidiram esperar pelo dia seguinte para desembarcarem. No crepúsculo da manhã já eles andavam numa grande azáfama, prepararando a ida a terra. Mal o baço nevoeiro se desvaneceu, rumaram à praia sob o comando do valoroso João. Ao pisarem as granuladas areias sentiram o suave aroma da natureza, que lhes trouxe belas recordações. Mas, subitamente, começaram a surgir da densa ramagem gentes atónitas. A sua feição era amarela, os seus olhos em bico. As crianças tocavam-nos curiosamente e quando os nautas se mexiam corriam a esconder-se atrás dos adultos. Eram muito semelhantes aos habitantes de Malaca contudo, muito mais hospitaleiros. Só depois de os alimentarem e de os vestirem com roupas lavadas, é que os deixaram esboçar umas palavras, mas em vão: nada percebiam do que os lusitanos diziam e estes muito menos os entendiam. No entanto, passados dias, os gestos trouxeram o entendimento e a amizade. A vontade de partir era pouca. Tinham criado afeição por aquele local utópico. A hora do adeus foi sentida por todos, mas João prometera a si próprio que voltaria. Partiram para sul, segundo indicações dadas pelos indígenas. Levavam consigo tecidos de rara beleza, feitos com a seda mais pura e as famosas porcelanas chinesas. Semanas depois, graças à ajuda de favoráveis ventos encontravam-se já em Malaca. O espanto foi geral, pois ninguém esperava voltar a vê-los. A estadia, porém, não iria ser prolongada. Depois de comunicar ao vice-rei - D. Afonso de Albuquerque - as suas intenções, João partiu com nova e reforçada armada. Aventurou-se de novo nas terras da seda, prosseguindo a expansão do Império para o extremo oriente. Levou consigo mercadores e missionários e, aos poucos, foi conquistando terras aos orientais: Lampacau, Liampó e ... Macau. Aí fundou feitorias e missões. Mas como as civilizações asiáticas eram antigas e desenvolvidas, com raízes culturais, artísticas e religiosas muito profundas, não bastava conquista-los pela força, era necessário negociar. O diálogo trouxe a João inigualáveis riquezas. Toda a gente admirava a sua alma de mercador. Aos poucos, as influências europeias foram entrando. Macau tornou-se na mais próspera feitoria Lusitana na China e mantém-se, desde então, sob a Administração Portuguesa."
As palmas bailavam nas costas do vento naquele ledo entardecer. Ti Manel nunca se tinha esmerado tanto a contar uma história. Ainda hoje sinto o meu coração pular quando relembro esse dia.
A 31 de Dezembro de 1999 Macau deixa de estar sob a administração portuguesa, mas João vai ficar no oriente com a sua cultura, os seus costumes, o seu espírito aventureiro, a sua língua.
Pergunto-me, também, quem raio usa como pseudónimo algo como "Lives"? O regulamento exigia que escrevessemos sob a égide de um pseudónimo e eu escolho um completamente estúpido. Sem comentários.
Bem, o que é facto é que lá fui, durante 9 dias, até Macau, Hong Kong e China. E só para que fiquem ainda mais invejosos, tudo em hotéis e restaurantes de 5 estrelas.
Finalmente, a pedido de algumas almas, aqui fica o dito texto, bem como algumas fotografias.
A Chegada dos Portugueses à China e a Fundação de Macau
Depois da morte da esposa o Ti Manel tornara-se melancólico. A alegria contagiante que ele transmitia era águas passadas. Até as histórias que a rapaziada gostava tanto de ouvir tinham perdido o brio. Mesmo assim, todos os dias, depois das aulas, íamos ter com ele para ouvirmos mais uma dos seus contos de encantar. Ainda me lembro bem daqueles velhos tempos, em que, com um suplicante olhar, pedíamos que nos contasse uma história: "- Conte-nos uma história Ti Manel". Ele largava o que estava a fazer e sentava-se no rústico banco de cortiça, que estava no centro do pátio, debaixo da velha oliveira. Ninguém tinha coragem de o interromper enquanto falava; e quando o burburinho acalmava, ele começava:
"- Era uma vez ...
- ... Um jovem aventureiro que, como outros do seu tempo decidira largar a casa paterna e rumar ao Oriente à procura de riquezas, quem sabe, de glórias. Seu nome era João. Era um Luso com ânsia de conquistas. Após venturosa jornada encontrou-se nas terras orientais, encontrou-se num mundo afortunado! Animais de muitas cores e feitios e flores tão variadas que tornavam o ambiente paradisíaco. Tantas belezas embeveceram-no, tantas riquezas seduziram-no!... Com o tempo, tornou-se num afamado mercador. Em troca das bugigangas europeias recebia as maiores riquezas que o mundo alguma vez vira. Eram naus de cravo e canela, ouro e marfim ... Obteve completo controlo da navegação no Incógnito e de alguns pontos estratégicos em terra. Os principais centros de comércio foram conquistados por ele. Tudo lhe corria favoravelmente. Aos poucos os seus sonhos iam-se concretizando.
Só que um dia, enquanto navegava pelo mar de Malaca com um carregamento de boas especiarias, desceu sobre a sua armada súbita procela. A espuma deixou de sorrir, o mar viu-se sem a sua luxúria azul. As naus em vão tentavam lavrar as truculentas águas. Das lúgrubes nuvens choviam relâmpagos encolerizados que rasgavam os celestiais véus. Temerosos trovões ecoavam pelos ares, fazendo-os estremecer. A dama de preto, com sua foice na mão, bem esperou por eles. Esperou, esperou, mas deles nada conseguiu. A vontade de viver era grande! Os nautas debatiam-se corajosamente com as águas furiosas que violentamente os sacudiam. Oraram aos céus, mas nada. Os ventos lutavam impetuosamente, as águas rugiam medonhas. E nisto andaram cinco dias ... depois, veio a bonança. Durante esses dias escuros como breu, uma embarcação perdeu-se, outra ficou com o mastro principal pela metade. Apenas uma nave se mantinha inteiramente viva. Estavam perdidos no grande oceano, como agulha no palheiro. Estavam ao sabor da maré, os errantes peregrinos. Os dias passavam e as esperanças iam fenecendo. Mas, semanas depois, enxergaram, ao longe, a tão desejada terra. Os olhos encheram-se de ledas lágrimas: todos se abraçavam calorosamente. Deus era louvado com harmoniosos cânticos. Como a penumbra já começara a baixar decidiram esperar pelo dia seguinte para desembarcarem. No crepúsculo da manhã já eles andavam numa grande azáfama, prepararando a ida a terra. Mal o baço nevoeiro se desvaneceu, rumaram à praia sob o comando do valoroso João. Ao pisarem as granuladas areias sentiram o suave aroma da natureza, que lhes trouxe belas recordações. Mas, subitamente, começaram a surgir da densa ramagem gentes atónitas. A sua feição era amarela, os seus olhos em bico. As crianças tocavam-nos curiosamente e quando os nautas se mexiam corriam a esconder-se atrás dos adultos. Eram muito semelhantes aos habitantes de Malaca contudo, muito mais hospitaleiros. Só depois de os alimentarem e de os vestirem com roupas lavadas, é que os deixaram esboçar umas palavras, mas em vão: nada percebiam do que os lusitanos diziam e estes muito menos os entendiam. No entanto, passados dias, os gestos trouxeram o entendimento e a amizade. A vontade de partir era pouca. Tinham criado afeição por aquele local utópico. A hora do adeus foi sentida por todos, mas João prometera a si próprio que voltaria. Partiram para sul, segundo indicações dadas pelos indígenas. Levavam consigo tecidos de rara beleza, feitos com a seda mais pura e as famosas porcelanas chinesas. Semanas depois, graças à ajuda de favoráveis ventos encontravam-se já em Malaca. O espanto foi geral, pois ninguém esperava voltar a vê-los. A estadia, porém, não iria ser prolongada. Depois de comunicar ao vice-rei - D. Afonso de Albuquerque - as suas intenções, João partiu com nova e reforçada armada. Aventurou-se de novo nas terras da seda, prosseguindo a expansão do Império para o extremo oriente. Levou consigo mercadores e missionários e, aos poucos, foi conquistando terras aos orientais: Lampacau, Liampó e ... Macau. Aí fundou feitorias e missões. Mas como as civilizações asiáticas eram antigas e desenvolvidas, com raízes culturais, artísticas e religiosas muito profundas, não bastava conquista-los pela força, era necessário negociar. O diálogo trouxe a João inigualáveis riquezas. Toda a gente admirava a sua alma de mercador. Aos poucos, as influências europeias foram entrando. Macau tornou-se na mais próspera feitoria Lusitana na China e mantém-se, desde então, sob a Administração Portuguesa."
As palmas bailavam nas costas do vento naquele ledo entardecer. Ti Manel nunca se tinha esmerado tanto a contar uma história. Ainda hoje sinto o meu coração pular quando relembro esse dia.
A 31 de Dezembro de 1999 Macau deixa de estar sob a administração portuguesa, mas João vai ficar no oriente com a sua cultura, os seus costumes, o seu espírito aventureiro, a sua língua.
8 comentários:
O pseudónimo não foi bem escolhido, é verdade (:p), mas para um miúdo de 14 anos o texto está muito bom ;) (eu, com 22, não escrevo melhor que tu aos 14 :s).
Já na altura, como ainda hoje, consegues sempre usar as "melhores" palavras, nos melhores "sitios"... Fazes-me sentir orgulho e... * , mas isso tu já sabes... :)
Depois de ver as fotos, só posso dizer duas coisas: que inveja!!! :p
Beijinho*
Inês
Já na altura sorrias mto para as fotos :p :p :p :p
tu não querias que eu ouvisse as historias do ti manel? snif snif
para 14 anos acho que está optimo...mas o que eu tenho mais inveja não é da maneira de escrever, mas sim do turismo...rrr
thanks babe
Se tu tivesses o dinheirinho da Oprah podias dar as voltas ao mundo que quisesses. Assim, nos próximos tempos tens que te contentar com NY. Coisa pouca, portanto! LOL
É de elevar a tua imaginação, já nessa altura.
É pena o Ti Manel não vos ter introduzido ao mundo sedento das ninfas, isso sim era grande (metro e meio) :p
Gostei de te ler!
Falta aos 14 a maturidade necessária para descrever as ninfas com a volúpia que se exige.
Caro amigo,
Como poderia eu esquecer-me deste magnífico texto se ainda guardo, com todo o carinho, a lembrança que recebi dessa tua viagem por terras do Oriente...um chapéu chinês! Vai dando notícias...
Prof. Paulo Paiva
Embora a definição de Blog não seja consensual, poderá dizer-se que em certa medida é uma forma de expressar ideias e opiniões. Porém, a expressão de ideias só se justifica quando existe do outro lado alguém que nos ouve e responde. Podemos ter 500, 1000, 2000 visitantes, mas isso de nada vale sem feedback. Daí a importância dos comentários, escritos ou falados - são eles que justificam a manutenção desta ideia que é o Doca do Tempo.
E, por vezes, por diversos motivos, há comentários que nos dão mais prazer a ler do que outros. É o caso deste último.
Dr. Paulo, foi com grande prazer que li o seu comentário. Muito obrigado pelas suas palavras. Digo-lhe ainda que a lembrança (sentida!) acaba por ser irrisória perante as boas lembranças que guardo dos 3 anos que partilhou connosco. :)
Abraço.
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